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Nasci no Recife, capital de Pernambuco, um dos 26 Estados do Brasil. Sou jornalista diplomada, amante da vida e de tudo que é positivo, verdadeiro e autêntico. Deixei as águas do Capibaribe, o mais famoso rio que banha o Recife. Atravessei o Oceano Atlântico e desaguei no rio Tejo, que acalenta Lisboa. E para aproximar esses dois lugares tão distantes mas com fortes ligações históricas e culturais, dei início a construção desta "ponte" Pernambuco-Portugal.

sábado, 15 de junho de 2013

Sintra e os seus mistérios



Vegetação da Serra de Sintra
 

Por  Maria do Céu Carvalho Dias*
Fotografias: Miguel Nuno Peixoto de Carvalho Dias


 Sintra é uma povoação sede de um concelho próximo de Lisboa e dos mais populosos de Portugal. Tem património construído de várias épocas históricas, bem como um excepcional património natural. Desde cedo entusiasmou o Homem, talvez porque Sintra está imbuída de um espírito mágico-religioso considerável. Os reis portugueses viveram e visitaram Sintra durante muitos séculos; só no século XVIII os palácios de Mafra e Queluz os fizeram esquecer esta zona, recuperada no século XIX pelo romântico Fernando II, marido de D. Maria II. Eça de Queirós colocou personagens de Os Maias a visitarem Sintra. Muitos artistas nacionais e estrangeiros ficaram emocionados e atraídos pela ambiência destas paragens. Glauber Rocha, cineasta brasileiro, morreu aos 42 anos, dizendo que Sintra era um lugar belo para morrer.
 
A Serra de Sintra transmite-nos um espírito mítico e simbólico com os monumentos megalíticos; com os nomes que lhe estão associados – Mons Sacer ou monte santo, Monte da Lua; pode-se considerar um pólo religioso da região saloia abastecedora de Lisboa, que olha o céu e vê o mar a dois passos; com a ocupação romana, de que frutificam resíduos de Villae senhoriais, enriquecidas por múltiplos espólios arqueológicos, em que se destacam São Miguel de Odrinhas; com a época muçulmana, que legou as azenhas, o linguajar, e, sobretudo, o “Castelo dos Mouros”. Esta fortificação terá sido erguida quando os árabes chegaram a Sintra (século VIII e IX) e lhe chamaram Xintara, Xentra ou Shantara.
 

Castelo dos Mouros
 Mais tarde Sintra é conquistada por D. Afonso Henriques (Século XII), recebe carta foral estabelecendo-se então o concelho de Sintra que se desenvolve cada vez mais. A propósito quero recordar lendas de “mouras encantadas”, como a da origem do local “Seteais” que é um palácio construído no século XVIII numa das extremidades da povoação e donde se abarcam panorâmicas lindíssimas, desde que não haja nevoeiro. Segundo esta lenda, após a conquista aos árabes, um dos primeiros cavaleiros cristãos a subir a serra de Xentra foi D. Mendo de Paiva que encontrou uma porta secreta por onde fugiam vários mouros. Com eles fugia também uma moura muito bonita com a sua velha aia. Quando viu o cavaleiro, a jovem suspirou. A aia pediu-lhe que não suspirasse mais. D. Mendo resolveu fazê-la prisioneira e ela voltou a suspirar. Este novo suspiro fez com que a aia contasse que a bela moura tinha sido amaldiçoada por uma feiticeira e que morreria no dia em que desse sete ais. Novo suspiro é dado pela jovem, mas como o cavaleiro não acreditou na história a moça dá outro suspiro. D. Mendo anuncia que as vai fazer prisioneiras e novo suspiro se ouve. Entretanto o cavaleiro afasta-se e surgem árabes que se preparam para levar as duas mulheres, mas antes cortam a cabeça à velha e a moura dá mais um ai (o sexto). O sétimo foi quando a jovem moura percebeu que também lhe iam cortar a cabeça. O cavaleiro cristão ficou muito desgostoso e deu àquele lugar o nome de Seteais que ainda hoje perdura.

Palácio Nacional de Sintra (Paço Real ou Palácio da Vila)
            Toda esta região está ligada a lendas de gigantes que se prendem com as origens de Portugal e que são reforçadas com a presença constante da Corte, desde o rei D. João I, no Paço Real da Vila que foi sendo remodelado ao gosto gótico, manuelino e islâmico. Muito interessante é encontrar neste paço espaços de sobrevivência islâmica como lagos, fontes e pátios ou toponímia como “Terreiro de Meca”. Lembremos a Sala dos Árabes, uma sala antiquíssima revestida de azulejos sevilhanos do século XV e uma fonte de mármore. Há também uma sala no 1º andar que nos recorda uma parte triste da História de Portugal do século XVII: um rei – D. Afonso VI – que não soube governar, foi deposto e preso até morrer aqui no Paço de Sintra.

Passemos agora ao cume da Serra de Sintra onde D. Manuel mandou erguer em 1511 o Mosteiro hieronimita de Nossa Senhora da Pena, também denominado “conventinho”. Outra vez “os ecos duma lenda antiga que nos conta que, andando D. Manuel a caçar pelo alto da serra e preocupado com novas da viagem de Vasco da Gama à Índia, avistou, de um dos picos onde existia uma ermida dedicada a Nossa Senhora da Penha, a nau de Nicolau Coelho a entrar a barra do Tejo. Pela graça concedida, o rei mandou construir o Mosteiro que mais tarde muito sofrerá com o terramoto de 1755.
Palácio da Pena

“Depois, muito depois, houve um príncipe da Baviera que teve um sonho. Chamava-se D. Fernando de Saxe Coburgo-Gotha e casou em 1836 com a nossa rainha D. Maria II, filha de D. Pedro IV de Portugal, o Pedro I, 1º imperador do Brasil. Homem detentor de uma sensibilidade invulgar e apurado gosto, adquiriu, a expensas próprias, as ruínas do antigo cenóbio (o conventinho) e toda a mata circundante, incluindo o Castelo dos Mouros. Mandou plantar o fabuloso Parque da Pena, verdadeiro museu botânico que contém espécies das mais variadas partes do mundo. Idealiza com o arquitecto prussiano barão de Eschewege um palácio mítico-mágico, baluarte do romantismo e revivalismo do século XIX.” Os apontamentos decorativos transmitem-nos muito do espírito da época influenciado por organizações secretas e ritualistas que vêm dos Irmãos Rosa-Cruz (século XVII), ou até mesmo dos Templários e da Maçonaria. Até os jardins e as estátuas que os decoram sofreram influências destes ideários. Não esqueçamos a origem alemã e a mentalidade germânica deste rei-consorte ou rei-artista: com ele chegou a Portugal a árvore de Natal e as decorações natalícias, como abetos e romãs, que hoje tanto apreciamos. O próprio Rei se vestia de S. Nicolau (o Pai Natal) e distribuía os presentes aos seus filhos.

Chalet da Condessa d’Edla
D. Maria II morre (1853) muito nova e D. Fernando acaba por casar com a reputada cantora de origem alemã – Elisa Frederica Hensler - Condessa d’Edla depois de ter recebido o título do Príncipe Ernesto II de Saxe. Tal como D. Fernando, era amante do Parque de Sintra e colabora com ele em inovações, como a vinda de espécies botânicas da América do Norte, onde vivera. É de sua autoria a planta de um Chalet, o Chalet da Condessa d’Edla que abriu agora ao público e cujo estilo arquitectónico é curiosíssimo e em cuja decoração é usada a cortiça.

Em Sintra as quintas, os chalets e os palacetes são a moda, por isso vamos encontrar, entre outros, o Parque e Palácio de Monserrate e a Quinta da Regaleira. Monserrate recebe no fim do século XVIII a construção de um palacete ao estilo neo-gótico; mas é o segundo arrendatário - Francis Cook -  que manda construir o pavilhão  de gosto orientalizante, que hoje podemos visitar, a par dos jardins com uma variedade imensa de espécies botânicas, lagos e espaços para festejar o romantismo do século XIX e a beleza natural no século XXI.


Quinta da Regaleira
A Quinta da Regaleira foi edificada no princípio do século XX ao sabor romântico e com construções nascendo no meio duma floresta luxuriante; é o resultado dos sonhos mito-mágicos do seu proprietário António Carvalho Monteiro (o Monteiro dos Milhões) e do arquitecto italiano Luigi Manini. Aqui encontramos as variadas correntes artísticas aliadas à glorificação da história nacional influenciada pelas tradições míticas e esotéricas.

É difícil descrever este espaço. É um lugar para se sentir. É necessário visitar e conhecer a cenografia dos jardins e das edificações, percorrer o Parque exótico, sentir a espiritualidade cristã na Capela da Santíssima Trindade e descer à sua cripta. Há espaços em profusão e feitos de lendas.

Para culminar uma visita deste tipo pode-se ainda descer por uma imensa escadaria em espiral ao monumental poço iniciático invocando os cavaleiros templários ou os mestres da maçonaria, ou respirar ar puro ao mesmo tempo que se olha o horizonte.

Se estiver em Sintra à hora do lanche não deixe de comer ou comprar umas queijadas e uns travesseiros, especialidades locais.

 Fontes:
- Guiões de visitas de estudo de alunos da Escola Secundária de Sampaio, Sesimbra a Sintra. História da Arte em Portugal, volumes 5 e 10. Lisboa Manuelina (1495-1521), Instituto Português de Museus.
- Camara Municipal de Sintra:  http://www.cm-sintra.pt

           
* Maria do Céu Carvalho Dias é formada em História pela Universidade Clássica de Lisboa e junto com Miguel Nuno Carvalho Dias edita o blog Covilhã subsídios para sua história
 

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