Por Maria do Céu Carvalho Dias*
Estamos na Praça do Império, o coração simbólico da cidade de Lisboa e até de Portugal. Foi em 1940, em plena Segunda Guerra Mundial, que Salazar e o seu ministro António Ferro decidiram mostrar Portugal ao Mundo, através da Exposição do Mundo Português ou Exposição dos Centenários (do nascimento de Portugal, 1140 e da Restauração de Portugal, 1640), localizada precisamente em Belém, onde vem a ser a Praça do Império. Da época podemos observar a Fonte Luminosa ou Monumental que possui um conjunto de 32 brasões representando as antigas províncias do Império e se deve ao arquitecto Cottinelli Telmo; a escultura dos cavalos-marinhos da autoria de António Duarte colocada em quatro lagos; o Espelho de Água; o pavilhão da “Secção da Vida Popular”, hoje reformulado no edifício do Museu de Arte Popular e o Monumento ou Padrão aos Descobrimentos encomendado ao já referido Cottinelli Telmo e ao escultor Leopoldo de Almeida, embora o de hoje seja uma réplica do original. O Monumento, “ainda que limitado pelos estreitos quadros mentais da época”, e a sua localização embelezam a zona. Pretende homenagear todos os que se empenharam na Expansão portuguesa e por isso tem a forma de uma caravela estilizada, vendo-se o escudo de Portugal e a espada da Casa Real de Avis, à qual pertence o Infante D. Henrique que se ergue à proa. De cada lado observamos 33 personalidades, desde o poeta Camões ao pintor Nuno Gonçalves, passando pelos navegadores Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral. No interior pode haver exposições e há um elevador que nos conduz ao 6º andar, donde descortinamos uma vista fabulosa do Tejo e de Belém. O pavimento junto do monumento apresenta uma gigantesca rosa-dos-ventos oferecida pela África do Sul em 1960, aquando das comemorações do 5º centenário da morte do Infante.
Eis que chegámos frente ao Mosteiro dos Jerónimos – Mosteiro de Santa Maria de Belém – obra do estilo gótico tardio, com decoração manuelina e renascentista, conjunto monástico entregue aos monges Jerónimos por D. Manuel, no princípio do século XVI. Os arquitectos foram Boitaca e João de Castilho, que acompanhado de vários colegas e mais de cem operários ergueram a obra que sobreviveu ao terramoto de 1755 e até aos invasores franceses no princípio do século XIX. Este conjunto pretendia ser um convento-palácio com uma componente comercial, ao executar-se um enorme armazém, onde os navios fariam “aguada”. Mais tarde, no século XIX, os românticos resolveram modificar e acrescentar elementos ao conjunto. A Igreja-salão com a abóbada estrelada, os portais, os claustros de João de Castilho e Diogo Torralva e ainda os túmulos de personalidades do século XVI, como D. Manuel, D. João III, D. Sebastião, o cardeal- rei D. Henrique, Camões e o poeta Fernando Pessoa do século XX são algo que vale a pena observar. Ainda dentro da cerca do Mosteiro foram construídas duas Capelas: a do Santo Cristo e a de S. Jerónimo.
Próximo situa-se o Centro Cultural de Belém, construção concebida para receber a presidência portuguesa da Comunidade Europeia em 1992. Quando o concurso foi publicado nasceu uma forte polémica por a sua implantação ser paredes meias com os monumentos ligados ou representativos dos Descobrimentos e em locais donde saiam os descobridores. O concurso avançou, o projecto ganho pelo português Manuel Salgado e pelo consórcio do italiano Vittorio Gregotti começou e muito se discutiu então, também por o estilo nada ter a ver com as antigas construções. Todavia hoje ninguém passa sem o Centro Cultural de Belém que oferece espaços culturais para conferências, teatro, música, fotografia, exposições e um Museu, a Colecção Berardo. Também é possível usufruir da vista do rio Tejo e de artistas ali presentes, sentado nas esplanadas dos jardins, ou aproveitar do restaurante ou cafetaria.
Padrão dos Descobrimentos
A nossa visita termina na Torre de Belém ou Torre de S. Vicente (século XVI), construção de Francisco Arruda, que tal como o Mosteiro tem decoração manuelina, sendo uma combinação entre a tradição medieval e as novas técnicas de fortificação. Embora hoje esteja na margem do rio Tejo, o certo é que foi construída a uns duzentos metros da costa. Podemos considerá-la o baluarte do Restelo, o complemento do Mosteiro dos Jerónimos e um palco privilegiado, devido à localização e aos vistosos balcões para assistir às cerimónias de partida e chegada das armadas das Descobertas. Foi nesta zona que Luís de Camões, em “Os Lusíadas”, colocou o episódio de “O Velho do Restelo”. Na realidade esta torre foi pouco utilizada como sistema defensivo, mas mais como prisão e local de habitação do governador. A função festiva que virá a ter, é manifesta logo na inauguração durante o casamento de D. Beatriz, filha do rei D. Manuel, com Carlos de Sabóia em 1521. O simbolismo da época de D. Manuel está presente em toda a decoração, desde nós, cordas, conchas e corais, até à cruz de Cristo e esfera-armilar, passando por animais exóticos, como o rinoceronte, bicho desconhecido na Europa e que Afonso de Albuquerque (2º vice-rei da Índia) recebeu de presente e mandou ao Rei, que por sua vez o ofereceu ao Papa na embaixada que lhe enviou. O coitado e estranho animal para o Portugal da altura, morreu à entrada do porto de Génova, mas mesmo assim chega a Roma embalsamado. A Torre de Belém, como espaço vivo que é, pode ser visitada para se olhar o panorama e assistir a espectáculos.É amante de barcos? Gosta de velejar? Tem na Praça do Império a doca de Belém com cerca de duzentos lugares para embarcações. Se quiser passear mais, ou subir para trás da Praça do Império, vai encontrar uma zona residencial de vivendas, o Restelo. Vagueando por ali pode chegar ao Clube “Os Belenenses” cujas tradições vêm do princípio do século XX e pode atingir a ainda freguesia de S. Francisco Xavier, onde encontra outra zona residencial, esta de apartamentos e o Museu Nacional de Etnologia que apresenta milhares de peças de Portugal, das ex-colónias e uma interessantíssima galeria representativa dos Índios do Brasil.
Fontes: Franco, Anísio em programa cultural de televisão. História da Arte em Portugal. Lisboa Manuelina (1495-1521), Instituto Português de Museus.
http://www.jf-belem.pt http://www.cm-lisboa.pt .
Veja neste blog os outros episódios da série Praças e Ruas de Lisboa:
- Praça D. Pedro IV:
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/01/praca-d-pedro-iv-mais-conhecida-por.html
- O Chiado:
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/01/o-chiado-lisboa.html
- Avenida Álvares Cabral
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/02/avenida-alvares-cabral-lisboa.html
- Praça Bernadino Machado:
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/02/praca-bernardino-machado-lisboa.html
- As freguesias de Lisboa:
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/02/as-freguesias-de-lisboa.html
- Belém - Lisboa. Do Museu da Electricidade até à Praça do Império:
http://docapibaribeaotejo.blogspot.com/2011/03/belem-lisboa-do-museu-da-electricidade.html
* Maria do Céu Carvalho Dias é formada em História pela Universidade Clássica de Lisboa
Saudade da minha Lisboa, do meu Portugal.
ResponderExcluirParabéns, senhora professora.
João Alves
Os textos da professora Céu comprovam que podemos "viajar" pelo mundo através das letras.
ResponderExcluirExcelente!
Gostei muito desse "passeio" por Lisboa.
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