A editora

Minha foto
Nasci no Recife, capital de Pernambuco, um dos 26 Estados do Brasil. Sou jornalista diplomada, amante da vida e de tudo que é positivo, verdadeiro e autêntico. Deixei as águas do Capibaribe, o mais famoso rio que banha o Recife. Atravessei o Oceano Atlântico e desaguei no rio Tejo, que acalenta Lisboa. E para aproximar esses dois lugares tão distantes mas com fortes ligações históricas e culturais, dei início a construção desta "ponte" Pernambuco-Portugal.

domingo, 1 de agosto de 2010

Uma lição de portuguesismo

Torre dos Clérigos - Fotografia: Miguel Carvalho Dias

*Por Maria do Céu Carvalho Dias

O Porto é a segunda maior cidade portuguesa, localiza-se no NW de Portugal e é banhada pelo Rio Douro. O orgulho dos portuenses prende-se com a formação de Portugal e a origem do nome “Portugal”. A primeira referência escrita a uma povoação nas margens do Rio Douro – Cale – data pelo menos do século V (época romana). Poderá ter havido na outra margem um local de portagem, Portus e as duas zonas originaram Portucale; com os Suevos e os Visigodos (povos invasores germânicos), Portucale, entretanto Porto, foi sede de bispado e situava-se, claro, na foz do Douro. Entretanto Portucale já não é só a cidade, mas um território, então Portugal, governado pelo Conde D. Henrique, a quem nos referimos, a propósito de Guimarães.

O brasão e a bandeira do Porto apresentam Nossa Senhora, desde estes tempos protectora da cidade e por baixo, em listel branco, as palavras:”Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto” Porquê Invicta? Este título, único nas cidades portuguesas, foi dado ao Porto depois da bravura com que os seus habitantes defenderam a cidade durante o Cerco do Porto, na Guerra Civil de 1832-34. Esta guerra foi entre liberais chefiados por D. Pedro IV (1º Imperador do Brasil) e miguelistas, partidários de D. Miguel, irmão de D. Pedro. Os liberais saem vitoriosos, D. Pedro morre em 1834 no Palácio de Queluz (Lisboa), não sem antes ter oferecido o seu coração à cidade do Porto pelo contributo desta à causa liberal. Por outro lado, D. Miguel é obrigado, pela Convenção de Évora-Monte, a deixar Portugal. Foi um período muito conturbado, mas nesta altura fica D. Maria II, filha de D. Pedro e que nascera e vivera no Brasil no princípio do século XIX, aquando da ida da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, a governar Portugal. É esta rainha que ratifica por decreto todos estes títulos.

Muito antes destes acontecimentos, no século XIV, casou nesta cidade D. João I com a nobre inglesa D. Filipa de Lencastre, nasceu um filho – o Infante D. Henrique - um dos impulsionadores da Expansão portuguesa. E é alguns anos depois, nas vésperas da Conquista de Ceuta (1415), que o Porto colaborou na organização daquela expedição, com dezenas de barcos e respectiva tripulação; mas foi ainda mais longe abastecendo a armada de carne limpa, ficando os habitantes com as tripas para si. Passaram a confeccionar com elas um prato muito saboroso ”Tripas à moda do Porto” e a designarem-se de tripeiros, alcunha mais honrosa que pejorativa. Como parêntesis curioso, direi que os lisboetas são conhecidos popularmente como alfacinhas, talvez porque desde o século XII há escritos que referem as encostas de Lisboa como muito férteis de produtos frutícolas e hortícolas; decerto com alfaces, palavra provavelmente de origem árabe e até trazida por eles para a Península no século VIII. Sobre gastronomia ainda vale a pena referir outros pratos, como o Bacalhau à Gomes Sá que retira o seu nome de um comerciante de bacalhau, da cidade do Porto. Muito famoso recentemente é a Francesinha, cuja origem vem, talvez, das Invasões Francesas, pois os soldados invasores faziam sandes com todo o tipo de carnes que tinham à mão, cobertas de queijo, às quais os portugueses acrescentaram um delicioso molho.

Quando se escreve sobre o Porto é impossível esquecer a rivalidade económica, política e hoje essencialmente futebolística que sempre existiu com Lisboa. Portugal nasceu a partir do Norte, quando os reinos cristãos vão expulsando os Árabes para Sul até Faro, no Algarve (1253). Lisboa só mais tarde é capital do Reino, já que fica mais central. Lembremo-nos da razão da construção de Brasília em 1960, ou de Madrid no século XVI. Os portuenses muitas vezes se sentiram marginalizados pelo poder central, sobretudo durante o salazarismo (Estado Novo). A luta Norte/Sul, hoje, é ainda visível no campo futebolístico (o Porto tem o clube mais antigo de Portugal), entre os adeptos do Futebol Clube do Porto e os do Benfica ou Sporting, clubes de Lisboa, ou seja entre Tripeiros (do Porto) e Mouros (de Lisboa).

No Porto não deixe de visitar a Zona antiga (medieval), a barroca, cujo ex-libris é a Torre dos Clérigos, do arquitecto italiano Nasoni, e, claro, a Bolsa, a Casa da Música, o Museu de Arte Contemporânea de Serralves, com o seu agradável parque (um verdadeiro museu de flora) e se apreciar arte moderna, o Museu Soares dos Reis. É amante do vinho do Porto? Então visite também as Caves do vinho do Porto que se situam na margem esquerda do rio Douro, em Vila Nova de Gaia.

Termino, recordando o meu professor de “Cultura Portuguesa” Vitorino Nemésio, escritor português do século XX: “ Uma ida ao Porto é sempre uma lição de portuguesismo, tanto mais rica quanto mais raramente lá se vai. É indispensável – claro! - um mínimo de contacto reiterado com esse lar da nação para nele vermos algumas das significações latentes que enriquecem a nossa consciência de pátria”
Fontes: “História de Portugal” de A. H. de Oliveira Marques; Dicionário de História de Portugal e Publicações sobre o Porto.

* Maria do Céu Carvalho Dias é formada em História pela Universidade Clássica de Lisboa

6 comentários:

  1. Uma lição muito bem dada por quem demonstra ter conhecimento do assunto e clareza nas idéias. Professor é a profissão mais importante do mundo. Até um médico que salva vidas precisou de um professor para aprender o ofício.
    Voltando ao tema, adoro Lisboa mas acho o Porto mais bonito. O Douro é um espetáculo.

    ResponderExcluir
  2. Professora, a senhora faz com quem um texto tão longo não seja chato. Como no seu artigo sobre Inês de Castro, Patrícia informa que a senhora nasceu na Nazaré, então a senhora não está no meio da rivalidade Lisboa-Porto, e fico mais a vontade para dizer que tb adoro Lisboa mas acho o Porto mais bonito. Ou melhor, acho o Douro mais bonito que o Tejo. Talvez porque o Douro parece mais um rio e o Tejo, por ser tão grande, parece um mar.O vinho do Porto é um néctar dos deuses e o sanduiche francesinha é muito gostoso. Conheço Lisboa, Porto, Sintra e Cascais. Fale sobre sua terra, professora.Ela não é conhecida aqui no Brasil.
    Parabéns!

    ResponderExcluir
  3. Professora, obrigado por atender meu pedido. Agora já sei muito mais coisas sobre o Porto. Visitei a maioria desses lugares que a senhora falou. Fui numa cave do vinho do Porto. Provei todas os tipos de vinho, quase que não fazia um quatro quando saí de lá. Por sinal, o preço dessa bebida no Brasil é muito caro. Vcs portugueses são uns sortudos que podem beber vinho do Porto como se fosse água de tão barato que é aí.
    Minha opinião é a seguinte: o Douro é mais bonito que o Tejo mas Lisboa é mais bonita que o Porto.
    Parabéns, professora.

    ResponderExcluir
  4. Parabéns pela aula sobre o Porto. A senhora é especialista em história de Portugal ou tb escreve sobre o Brasil? Faça um texto sobre algo dos portugueses em Pernambuco. Aqui há muitos portugueses donos de padaria e tem uma sapataria Esposende que o dono é português.
    Professora, gosto nao se discute mas eu acho Lisboa bem mais bonita do que o Porto. Conheço as duas cidades e amo Régua.
    A mulher que atravessa a rua na foto é a senhora? Já sei que Miguel é o sogro de Patrícia e a senhora é a sogra.A foto é dele entao a mulher da foto pode ser a senhora rsrs.
    Parabéns mais uma vez

    ResponderExcluir
  5. Que delícia de texto, que aula de história portuguesa.
    Para quem já esteve em Portugal, especialmente em Lisboa e Porto fica a saudade, e certamente para quem não teve a felicidade de conhecer um dos países mais lindos e histórico da Europa fica o desejo de fazê-lo.
    Falar sobre o que se aprendeu com esta verdadeira aula da professora Maria do Céu,não
    é preciso.
    Melhor que isto, só ter a honra de lhe ter como amiga

    ResponderExcluir
  6. Obrigada pelos comentários. A pessoa da foto não é Maria do Céu. Em breve, vou postar textos relacionados com a história de Pernambuco também.
    beijos para todos

    ResponderExcluir